quinta-feira, 30 de junho de 2011

Onde está a racionalidade do homini consummus?

Foto com os amigos na balada. Foto segurando uma garrafa de champagne. Da família na praia. Do namorado. Do carro novo. Do celular quebrado. Do céu laranja-poluído. Da guitarra importada. Com um toque - e daqui a algum tempo só com a voz, um piscar de olhos e quem sabe até, com a força do pensamento - todas essas fotos estarão no Facebook, Twitpic, Instagram, Flickr, Weheartit, Tumblr e uma infinidade de outras redes sociais mundo virtual afora. E é, cada vez mais, para isso que as social media servem: mostrar para o mundo como a nossa vida é dinâmica, feliz e completa.
Elas se tornaram um verdadeiro jornal público, onde todos os dias atualizamos nossos perfis na rede com o que fizemos hoje, o que faremos à noite, conquistas e desabafos.
Estamos em uma era de Zuckerberg's e alcançar esse status é uma verdadeira vitória de Piro ao observarmos como as relações entre os indivíduos estão cada vez mais frágeis.
Esse auto-marketing realizado por nós todos os dias, de maneira inconsciente, nos aproxima cada vez mais da condição de meros produtos a serem consumidos. Procuramos pessoas com interesses parecidos, estilos de vida atraentes, bonitas e com um padrão social próximo ao nosso. E quer maneira mais fácil, rápida e eficiente para isso do que as redes sociais?
Estabelecemos novas conexões com a mesma facilidade com que vamos ao mercado comprar um quilo de arroz. E nos prendemos, cada vez mais, na nação imaginada de Benedict Anderson. Estaremos sempre cercados de pessoas que são parecidas conosco. As novas gerações não conviverão com as diferenças. Estabelecemos as fronteiras da nossa própria nação ao nos fecharmos todos os dias em nossas bolhas.
Você já reparou que a "sugestão de amigos" do seu Facebook só lhe mostra pessoas que te despertam algum interesse? Pense em um garoto que more no interior da Califórnia, tenha 17 anos e goste de punk. A sugestão de amigos dele, com certeza, não terá uma menina de 15 que goste de Chopin. E por que ele iria querer se relacionar com uma pessoa assim? Ela não vai lhe trazer nenhuma vantagem a curto ou a longo prazo - na mente dele.
O Google entrou na briga das redes sociais e em breve vai lançar o Google+. Qual você acha que é a proposta? Se você apostou em manter contato com os amigos e familiares, conhecer pessoas novas e detalhar sua vida até o último fio de cabelo, acertou em cheio.
A tendência dos social media não é estourar a bolha em que você está enclausurado, mas fazê-la crescer. É separar o mundo em pequenos outros mundos de modo que você não tenha que manter ou criar contato com quem não vai te beneficiar. Se acontecer? O botão "deletar" resolve o seu problema.
Digamos que eu compre um celular novo, um iPhone 3GS. Você já estranhou, não é? Por que raios eu iria querer um desses se já há no mercado um lindo iPhone 4 esperando por mim e meu dinheiro? Pois bem. Que eu o compre e use por seis meses. Dezenas de novos modelos de celulares touch screen apareceram no mercado nesse meio tempo. O meu celular já não me desperta o mesmo interesse do que quando o comprei e, portanto, vou atrás de um novo. O 3GS está agora lá no meio do lixão, levando mais de cem anos para se biodegradar.
E quer saber, é a mesmíssima coisa em nossos relacionamentos. Assim que uma pessoa não nos desperta mais interesse, nos beneficia ou oferece qualquer vantagem e, pelo contrário, nos impede de acompanhar as mudanças que surgem a cada piscar de olhos, a descartamos. Temos o mesmo papel de uma organização, nas palavras de Richard Zennett, que deve mostrar ao mundo que é capaz de mudar. Nossos self's tem de mostrar à sociedade que somos capazes de acompanhar o seu fluxo dinâmico.
Mas veja, não somos monstros por sermos assim. Nos acostumamos, não é? Fazemos isso de maneira inconsciente porque cada vez menos temos tempo para pensar. Somos bombardeados com novas notícias, compromissos e situações em que temos que agir de maneira mecânica e irracional para não sermos deixados para trás. Ninguém quer ficar estagnado, queremos todos acompanhar a (in)evolução do mundo. Cruel, né?